segunda-feira, 31 de agosto de 2009

«Campanha anti-marquises em Setembro»


"Trata-se de um problema de educação cívica", comenta bastonário dos arquitectos, que fala em fenómeno único na Europa

As marquises nas fachadas dos prédios são um dos alvos de uma campanha que arranca no mês que vem para sensibilizar a população para os aspectos estéticos do fenómeno. As caixas de ar condicionado e os estendais também vão estar na berlinda nesta iniciativa, que, apesar de ter o apoio do Ministério do Ambiente, partiu de um gestor privado.

Aos 56 anos, Luís Mesquita Dias, que é presidente do conselho de administração da Unilever-Jerónimo Martins, decidiu que era altura de chamar a atenção dos portugueses para um fenómeno que diz nunca ter visto em parte nenhuma da Europa desenvolvida senão aqui - apesar de ter morado vários anos em Barcelona e Bruxelas e também em Banguecoque: "Choca-me ver o meu país degradar-se. Estamos a hipotecar a nossa paisagem urbana". Depois de, há 12 anos, ter tentado - sem sucesso - sensibilizar todas as câmaras municipais e várias outras entidades para a necessidade de pôr cobro àquilo que designa por "desordem urbanística", resolveu agir.

Um spot televisivo, outro radiofónico e cartazes nas ruas de Lisboa são as armas de que se muniu para desafiar a "impunidade com que se intervém nas fachadas dos prédios" e "a falta de controlo das entidades" responsáveis pela fiscalização. Com apenas 30 segundos, o spot televisivo mostra algumas marquises dos milhares delas que têm sido fechadas clandestinamente, aparelhos de ar condicionado colocados de forma indiscriminada e estendais "com cuecas que teimam em pingar", como diz a voz off do vídeo. "A cidade que temos é a cidade que fazemos", lê-se no final.

Casado e com dois filhos, Luís Mesquita Dias está ciente das reacções negativas que esta campanha - à qual se associaram parceiros não só institucionais como também privados, que pagaram os custos das suas diferentes vertentes - vai desencadear. As famílias com muitos filhos vão dizer que não têm outra alternativa senão pôr uma das crianças a dormir na marquise, antevê. "Mas não há famílias nos países onde o fenómeno nunca atingiu proporções semelhantes às portuguesas?", questiona.

Realista, o gestor sabe que é impossível arrancar as centenas de milhares de marquises clandestinas espalhadas pelo país. Por isso, apresenta uma solução: a colocação de estores brancos nestas excrecências acrescentadas às varandas. Todos iguais, de forma a uniformizar as fachadas.

O bastonário dos arquitectos, João Rodeia, ignorava a campanha que aí vem. Mas congratula-se por um particular ter resolvido chamar a atenção para o problema. "Não conheço outro país europeu em que isto aconteça", confirma. "Em Espanha as varandas têm toldos e as pessoas usufruem delas sempre que o bom tempo o permite". Então o que se passa em Portugal? "É uma questão de educação cívica", responde o bastonário. "E cada varanda tem um sistema de fecho diferente, o que desfigura ainda mais os edifícios".

"Compreendo a necessidade de espaço das pessoas, mas todos têm o direito a que as cidades não fiquem desfiguradas", acrescenta, referindo os anos e anos de permissividade das autoridades. "O que é mais angustiante é que a maioria das pessoas habituou-se a estes fenómenos e não os acha estranhos". Embora arranque em Lisboa, a campanha deverá estender-se ao Porto e eventualmente a outras cidades. In Público 27/8/2009

FOTO: Edifício da década de 60 do séc. XX na Rua António Pedro, 8. As varandas são óptimos locais para crescer plantas e assim contribuir para uma cidade mais saudável e bela. Encerrar as varandas com envidraçados contribui para o aumento da temperatura do ar (funcionam como estufas) para além de desfigurar a arquitectura da cidade.

4 comentários:

Greenie disse...

Não posso deixar de comentar este post.
Concordo que deixar as varandas abertas é muito mais bonito para a vista e saudável para o ambiente. Eu própria tenho duas varandas abertas na casa onde moro, carregadinhas de plantas, tais como as das fotos.
No entanto, não posso concordar quando se tenta comparar o nosso país com os outros países da Europa, em que, de certeza, o salário mínimo é muito superior a 450 €, sendo que, quando as famílias aumentam, basta arranjarem uma casa maior.
Aqui, onde se contam os "tostões" para pagar o empréstimo do T1, o que fazer quando surge uma gravidez inesperada? Fecha-se a varanda e arranja-se um espacinho para a criança.
Se esta medida vier a ser implementada, provavelmente a opção terá mesmo de ser o aborto.
Quanto aos estendais, vamos todos a correr comprar máquinas de secar roupa e contribuir para destruir um pouco mais o ambiente.
Numa época em que é tão necessário que se façam campanhas, isso sim, que convençam as pessoas a poupar energia, vem agora um "iluminado" preocupar-se com uma coisa que sempre existiu, é tão típica (é só ir a Alfama e ver os turistas encantados a tirar fotos à roupa estendida) e não prejudica ninguém (a não ser os olhos sensíveis do sr. Luís, que nunca viram cuecas a pingar, a não ser no nosso país).
Haja bom-senso!!!

Amigos do Jardim Botânico disse...

Concordamos consigo quando refere a questão dos estendais. Num clima como o nosso, não devemos contribuir com mais emissões de CO2 através da utilização de máquinas de secar roupa. Mas mesmo assim, é possível, e aconselhável, disciplinar os estendais. Por exemplo, e sempre que possível, devem estar localizados nas fachadas de tardoz e não nas fachadas principais. Em bairros de génese antiga, como Alfama e Mouraria, muitas vezes os munícipes não têm outra alternativa senão a de porem roupa a secar nas fachadas. Mas isto deve ser a excepção e, como diz, faz parte do carácter da cidade histórica.

Já em relação às marquises, lembrarmos que em grande parte dos casos as marquises aparecem em imóveis de apartamentos de grandes dimensões, da classe média e média alta. Um dos bairros mais afectados por este problema é a zona urbana do Areeiro e Alvalade. Basta observar os prédios de habitação nas avenidas de Roma e de João XXI para constatar como a arquitectura da cidade é desfigurada com marquises sem qualquer justificação.

Julgamos que esta iniciativa, embora imperfeita, tem a grande vantagem de lançar o debate para este problema, também ambiental, da nossa cidade.

Sandra disse...

As marquises e os estores de plástico que são instalados sem qualquer critério nas fachadas dos nossos prédios constituem um prova indiscutível de atraso da nossa sociedade.

Os outros países do mundo também têm famílias a viver em apartamentos pequenos. O Japão é um deles e no entanto não se vê lá este fenómeno. E na Europa a Holanda é um bom exemplo de como viver em apartamentos pequenos não leva à destruição da arquitectura dos edifícios.

Os portugueses não têm ainda grande capacidade para gerir o espaço, de o mobilar convenientemente. Acabam por ter excesso de mobiliário nas suas casas. E isso leva-os a forçar o edifício.

MAs também conheço famílias com posses, proprietárias de apartamentos com mais de 200 m2, e que fecham as suas varandas com argumentos ridículos como «assim já não chove na varanda» ou «é mais bonito e limpo»!

Resalvando casos especiais, diria que é tudo mais uma questão de educação, de cultura.

paulo disse...

Vivemos num país de bimbos.