quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Instalação de agências europeias nove meses atrasada

in Público, 13 de Agosto de 2008, por Ana Henriques

«Administração portuária não dá explicações, câmara diz que edifícios do Cais do Sodré deverão poder ser ocupados em breve

Está nove meses atrasada a instalação da Agência Europeia de Segurança Marítima e do Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência no Cais do Sodré, apesar de os novos edifícios que vão receber as duas instituições aparentarem estar prontos há vários meses.

A Administração do Porto de Lisboa, que é a dona da obra, escusa-se a explicar por que razão não foi ainda possível as agências mudarem para a sua sede definitiva. Refere apenas que "está a ultimar tudo para que possam finalmente instalar-se" no Cais do Sodré - algo que estava previsto para Novembro passado, na recta final da presidência portuguesa da União Europeia.

As duas instituições não escondem o desagrado que a demora lhes provoca. O porta-voz da Agência Europeia de Segurança Marítima, Andy Stimpson, fala da dificuldade de programar as actividades da agência a longo prazo com a mudança sempre iminente. "Não sabemos quando vai ser preciso estarem em Lisboa para a mudança os funcionários da agência que fazem inspecções Europa fora", explica, acrescentando que não faz bem nenhum à imagem da instituição a situação indefinida em que se encontra. Acresce que, ao contrário do que tinha sido anunciado, a agência está a pagar grande parte dos custos das suas instalações provisórias, o edifício de nove andares Mar Vermelho, no Parque das Nações. Andy Stimpson escusa-se a falar em montantes, mas diz que se trata de uma soma significativa.

Certificação a decorrer
Questionado também sobre que prejuízos acarreta o atraso na transferência, o Observatório da Droga e Toxicodependência diz que o principal problema se relaciona com o facto de continuar "a funcionar em dois edifícios distintos, um em Santa Apolónia e outro na Av. Almirante Reis, com todas as dificuldades inerentes de funcionamento e transporte - mais do que prejuízos financeiros, embora também existam". As novas instalações "parecem adequadas aos padrões de exigência comunitários, embora esse processo de certificação, que é feito com a ajuda especializada do serviço da Comissão Europeia responsável pela gestão de infra-estruturas, esteja ainda a decorrer", informa ainda o observatório.

O que correu então mal?
Em primeiro lugar, o facto de a administração portuária não ter tratado do licenciamento dos edifícios desenhados pelo arquitecto Manuel Tainha a tempo e horas, alegando que já tinha as autorizações necessárias por parte da câmara. Uma situação que vem do anterior mandato autárquico e que o actual vereador do Urbanismo, Manuel Salgado, classifica como caricata. Segundo o director municipal do Urbanismo, Gabriel Cordeiro, nesta fase do processo compete à administração portuária apresentar documentação como o livro de obra e a vistoria dos bombeiros, para que a câmara possa emitir a licença de utilização que permitirá ocupar os edifícios. O que pode acontecer até ao final do mês.

Arquitecto Manuel Salgado, eleito nas listas do PS nas autárquicas intercalares, tentou travar o projecto
Da autoria do arquitecto Manuel Tainha, o projecto para albergar no Cais do Sodré as agências europeias foi desde sempre mal-amado. Há um ano, durante a campanha eleitoral, o agora vereador do Urbanismo Manuel Salgado contava que ainda tentou impedir que as construções fossem por diante quando estava no grupo que elaborou o plano de reabilitação da Baixa, mas sem sucesso. Na mesma ocasião representantes da comunidade portuária garantiram que o projecto foi imposto à Administração do Porto de Lisboa pelo Governo. O Fórum Cidadania Lisboa fala no "atropelo ao usufruto pelo público da zona ribeirinha da antiga ribeira das Naus, acessível há seis décadas, desde a abertura da Av. Ribeira das Naus". O vereador eleito pelo Bloco de Esquerda José Sá Fernandes foi outro dos críticos do projecto. Tal como a Liga dos Amigos do Jardim Botânico, que se queixa de as novas construções ignorarem "preocupações ambientais como a preservação da biodiversidade, a poupança de água e os desafios colocados pelas mudanças climáticas", além de terem obrigado ao abate de "dezenas de árvores e arbustos".

Em Abril passado, a Câmara de Lisboa voltou atrás na decisão de deixar construir um terceiro edifício novo além dos dois que já ali foram erguidos para as instituições europeias. A proximidade dos edifícios do rio obrigou a criar durante a obra um sistema de drenagem e de rebaixamento do nível freático constituído por poços interiores e exteriores com bombas submersíveis. A proximidade do túnel do metropolitano foi outro problema que a empreitada do Cais do Sodré, a cargo do consórcio constituído pela Somague e pela Teixeira Duarte, teve de enfrentar.»

FOTO: Jardim entre a Ribeira das Naus e o rio Tejo, parte do qual foi destruído para a construção das agências europeias. Imagem de Artur Goulart datada de 1961. Fonte: Arquivo Fotográfico Municipal

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