Projecto de Resolução do Grupo Parlamentar do BE: Recomenda a protecção do Monumento Nacional JARDIM BOTÂNICO DE LISBOA
O Jardim Botânico da Faculdade de Ciências de Lisboa, inaugurado em 1878, é um patrimonio de inegável interesse do ponto de vista historico, cultural e cientifico no coração da cidade de Lisboa, levando todos os anos cerca de 80 mil visitantes a conhecer as suas mais de 1.400 espécies vegetais.
Conta com um banco de sementes que desempenha uma função crucial na conservação de recursos genéticos, detém importantes colecções de herbário, totalizando mais de 235 mil espécies, o que torna este Jardim num local de eleição para o ensino e a sensibilização ambiental, e possui diversas especies tropicais, oriundas da Nova Zelândia, da Austrália, da China, do Japão e da América do Sul, constituindo uma das mais valiosas colecções botânicas em Portugal.
Conforme descreve o Sistema de Informação para o Patrimonio Arquitectonico ‐ SIPA, alojado no site do IHRU, o Jardim tem um “valor cénico e botânico indiscutivel, num espaço onde recreio e o lazer se cruzam com o saber. A variedade de espécies demonstra os diferentes microclimas que ao longo do jardim se podem encontrar. Um dos mais importantes espaços verdes da cidade de Lisboa antiga”.
Esta importancia está reconhecida desde os anos 70, aquando da homologação do Jardim Botânico como Monumento Nacional, um processo só recentemente finalizado através do Decreto n.o 18/2010, de 28 de Dezembro, do Ministério da Cultura. Neste diploma justifica‐se a classificação do Jardim pela “sua relevância pedagogica, a diversidade de especies, com grande variedade de espécies exóticas, e a qualidade arquitectonica do edificio confinante da antiga Escola Politécnica ou as estruturas de apoio subsistentes no perimetro do Jardim” que “fazem deste espaço monumental um dos mais representativos do patrimonio urbano da Lisboa romantica, justificando-se plenamente a sua integral salvaguarda.” O documento refere ainda que a “classificação do Jardim Botânico de Lisboa contribuirá para a preservação do microclima da area, o que constitui condição sine qua non da sua subsistência”.
No entanto, não só esta classificação como Monumento Nacional exclui dos seus limites a Cerca Pombalina, desconsiderando este valor patrimonial, como a proposta de Plano de Pormenor do Parque Mayer, Jardim Botânico e Zona Envolvente, elaborada pela Câmara Municipal de Lisboa e colocada em consulta pública entre 22 de Outubro e 23 de Novembro de 2010, ameaça a salvaguarda e valorização do patrimonio e das missões cientifica e pedagogica do Jardim Botânico.
Este Plano de Pormenor preve a redução da area e dos limites actuais do Jardim, o abate de árvores, bem como a demolição de estruturas fundamentais, como é o caso de herbários, viveiros e estufas, alem da construção de galerias comerciais, hoteis e parques de estacionamento, aumentando a area impermeabilizada e de edificação na zona envolvente do Jardim, com consequencias graves na manutenção das suas condições, nomeadamente do microclima ou da circulação das águas interiores.
Por exemplo, o Plano de Pormenor prevê:
‐O aumento da altura media dos prédios em redor do Jardim, tornando‐o mais quente e seco no Verão, pondo em risco a sobrevivência de muitas especies e diminuindo a riqueza biologica do Jardim;
‐A construção de um novo edificio de 4 pisos na entrada do Jardim, no final da Rua Castilho, ocupando a actual área dos viveiros;
‐A criação de um percurso pedonal para fazer a ligação da Rua da Escola Politécnica à Rua do Salitre e a uma nova galeria comercial junto ao Parque Mayer, que irá ocupar o lugar de uma estufa, implicando a destruição de troços da Cerca Pombalina e a subtracção de um corredor do Jardim que tem especies de elevado valor botânico;
‐A construção de um parque de estacionamento subterrâneo com quatro caves na zona da entrada sul do Jardim, o que ocupará uma grande parte do subsolo dessa zona e vai obrigar ao abate de varias árvores e comprometendo outras por danos causados às raizes. [este estacionamento já foi retirado da proposta do PP]
Foram os próprios IGESPAR e Direcção Regional de Cultura de Lisboa e Vale do Tejo (DRC‐LVT), no ambito da conferencia de serviços, realizada a 22 de Julho de 2010, a colocar muitas duvidas relativamente a estes projectos, sem que as mesmas tenham sido resolvidas no documento colocado em consulta publica.
Refere o parecer do IGESPAR, datado de 26 de Julho de 2010, que “o Jardim Botânico, construido na cerca de um antigo convento, possui valor estético, artistico, historico e cientifico que importam conservar. Neste sentido, para conservar o carácter e valor culturais do espaço é necessario assegurar os seguintes factores:
1-manutenção das condições microclimaticas e de solo;
2-manutenção das condições hidrologicas e de drenagem dos solos;
3-manutenção das condições de ventilação e insolação;
4-manutenção dos elementos e materiais vivos e inertes que compõe o espaço;
5-manutenção da estrutura verde e do traçado do jardim, em conjunto com as edificações que o pontuam;
6-conservação de uma envolvente coerente com o carácter do espaço no que se refere aos factores ambientais e aos valores estéticos, historicos e artisticos.”.
Ora, nenhuma destas condições está assegurada com esta proposta de Plano, nem são conhecidos os estudos que o IGESPAR refere serem necessários.
O parecer da DRC‐LVT, de 23 de Julho, refere que as travessias devem ser preteridas ou devidamente fundamentadas porque podem “induzir a situações criticas decorrentes de um aumento de carga neste jardim”, ou que “a proposta de coberturas verdes de uso público condicionado (…) não pode envolver derrube de muros limitrofes, enquanto garantia da identidade deste imóvel”, ou que “a intervenção contempla alterações a nivel de áreas e estruturas (…) as quais deverão ser preteridas” em caso de impactes negativos ainda não estudados, ou que a “proposta de estacionamento automóvel subterrâneo deverá ser preterida pelos impactes negativos sobre os valores patrimoniais em presença”. [este estacionamento já foi retirado da proposta do PP]
No entanto, estas preocupações não estão expressas na proposta actual.
O Bloco de Esquerda considera que a proposta do Plano de Pormenor desvaloriza o Jardim Botânico de Lisboa nas suas diversas funções e não o salvaguarda enquanto Monumento Nacional, em nada contrariando o abandono e degradação a que foi votado ao longo dos anos. E inaceitável que se pretenda reduzir a área e limites do Jardim, destruir estruturas fundamentais ou ignorar a sua importante missão cientifica e pedagogica. Aliás, sendo um Monumento Nacional, o Jardim deveria estar sujeito a um Plano de Pormenor de Salvaguarda, como determina a legislação, estabelecendo “normas que sirvam de base ao processo da regeneração das áreas, contrariando a deterioração progressiva destes locais, por forma a que se obtenha a reconstituição das caracteristicas existentes à época”, o que não acontece no âmbito deste Plano que inclui uma zona territorial mais abrangente.
Acompanhamos, assim, a preocupação dos mais de 4.000 cidadaos que deram entrada na Assembleia da República de uma petição a exigir a revisão imediata deste Plano de Pormenor pela defesa da missão do Jardim Botânico e da sua sustentabilidade ambiental, social e economica a longo prazo.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe à Assembleia da Republica que recomende ao Governo:
1-Assegure a adequada protecção e requalificação do Monumento Nacional Jardim Botânico de Lisboa, ameaçado pela proposta do Plano de Pormenor do Parque Mayer, Jardim Botânico e Zona Envolvente, em fase de aprovação pela Câmara Municipal de Lisboa;
2-Inclua a Cerca Pombalina como parte integrante do Monumento Nacional Jardim Botânico de Lisboa;
3-Promova, junto das entidades competentes, a elaboração de um Plano de Pormenor de Salvaguarda para o Monumento Nacional Jardim Botânico de Lisboa, articulado com o Plano de Pormenor do Parque Mayer, Jardim Botânico e Zona Envolvente, de modo a ordenar, requalificar e promover o cumprimento das missões cientificas e pedagogicas do Jardim Botânico, prevendo inclusivé garantias financeiras para o seu regular financiamento;
4-Garanta que na Zona Especial de Protecção do Jardim Botanico de Lisboa não sejam permitidas novas construções junto ao muro do Jardim e se mantenha a permeabilidade dos logradouros da zona envolvente (Rua da Escola Politécnica, Rua do Salitre, Rua da Alegria e Calçada Patriarcal);
Palácio de São Bento,
24 de Março de 2011
Os Deputados e as Deputadas do Bloco de Esquerda